Se para boa parte das famílias, o 12 de outubro - Dia
da Criança, foi momento de celebrar a existência de meninos e meninas
que transformam vidas e alegram lares, para, pelo menos, 14 famílias no
Ceará, a data passou a ter sentido desolador esse ano. No Estado, em
2020, 14 crianças que sequer tinham chegado aos 6 anos de idade foram
assassinadas. A quantidade de homicídios esse ano, contra esse grupo
etário, é o maior desde 2010, aponta um levantamento do Comitê Cearense
pela Prevenção de Homicídios na Adolescência.
Conforme o levantamento, em 2020, o primeiro registro de homicídio de
criança menor de 6 anos ocorreu no dia 14 em fevereiro. O mais recente
foi no dia 29 de setembro. Dentre as vítimas no Estado, as mais velhas
tinham apenas 5 anos. Uma menina e um menino. Em três situações, as
crianças sequer tinham 12 meses de vida.
Das 14 crianças assassinadas em 2020 no Ceará, conforme o estudo, 9
foram atingidas por disparo de arma de fogo. Uma menina de 5 anos foi
agredida com arma branca e duas outras meninas e dois meninos foram
assassinados com uso de outros meios não informados, segundo os
registros da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social, diz o
levantamento.
Os homicídios aconteceram em 9 cidades diferentes. Seis crianças foram
mortas em Fortaleza, as outras em Beberibe, Caucaia, Granja, Guaiúba,
Itarema, Maracanaú, Russas e Tauá.
O coordenador da equipe técnica do Comitê de Prevenção e Combate à
Violência, Thiago de Holanda, reforça que é com tristeza e indignação
que o comitê lança esses dados sobre homicídios na primeira infância.
"Isso mostra que essas crianças estão vivendo em situação de
vulnerabilidade, nessas comunidades, e mostra que essa vulnerabilidade
pode ter se agravado neste período de isolamento, onde as crianças não
estão indo para a escola e escola é um lugar de proteção. Estão mais
expostas ao domínio de grupos armados nos territórios, confronto com a
polícia. Tanto crianças, como mulheres e idosos".
Maior número de ocorrências desde 2010
Na série histórica que começa em 2010, conforme dados disponibilizados
pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) e usados no
levantamento, antes de 2020, os anos com maior quantidade de
assassinatos de crianças até 6 anos foram 2011, 2011 e 2013, com nove
mortes em cada um. Somente até setembro deste ano, já morreram mais
crianças nessa faixa etária do que em 2018 e 2019 completos.
No levantamento, o Comitê de Prevenção e Combate à Violência, da
Assembleia Legislativa do Ceará, aponta que a violência letal é a
consequência extrema de um conjunto de fatores, entre eles "a grande
circulação de armas de fogo, sobretudo em áreas urbanas marcadas pela
extrema pobreza e exclusão social, uma realidade que tem se expandido
para cidades de médio e pequeno porte e também chegado às zonas rurais".
Por conta do domínio dos territórios por grupos armados, diz o
documento, "crianças vivem um cotidiano de medo, terror e morte, que se
aprofunda com a presença ostensiva, e muitas vezes truculenta, das
forças policiais".
Transformar áreas vulneráveis
Há anos, o Comitê tem atuado para mapear as ações de violência contra
crianças e adolescentes no Estado e formular orientações para reduzir o
problema e transformar as situações vulneráveis.
Dentre as iniciativas apontadas pelo Comitê para tentar reverter o cruel
quadro de violência na primeira infância, está a necessidade de
gestores executarem ações como o incentivo a projetos sociais, a
melhoria das escolas e dos equipamentos de assistência social nessas
áreas vulneráveis.
"Temos que colocar esses lugares precários, porque a morte começa no
abandono, na agenda da cidade para gente conseguir melhorar a qualidade
de vida e garantir o direito de viver de crianças e adolescentes",
reforça Thiago.
O SVM entrou em contato com a SSPDS para repercutir a situação. Em nota,
a SSPDS informou que "atua de forma preventiva visando coibir os Crimes
Violentos Letais Intencionais (CVLIs) de qualquer faixa etária e/ou
gênero, por meio da territorialização do policiamento em locais com
maior incidência de crimes".
Atualmente, diz a pasta, o Programa de Proteção Territorial e Gestão de
Riscos (Proteger) disponibiliza policiamento 24 horas em pontos
estratégicos de Fortaleza e da Região Metropolitana. O programa, garante
a SSPDS, faz o mapeamento de 70 indicadores como renda, saneamento e
educação, referentes às áreas críticas da Capital.
A SSPDS ressalta ainda que "suas vinculadas reforçaram as ações para
evitar os crimes violentos contra a vida" e cita a criação e início das
atividades coordenadas pelo Departamento de Proteção aos Grupos
Vulneráveis (DPGV) da Polícia Civil entre 2018 e 2019 e a ampliação do
número de delegacias do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa
(DHPP), de cinco para 11 em 2017.
A secretaria também informou que tem ampliado o trabalho de investigação
nas delegacias de todo o Estado. Segundo o órgão, o número de
delegacias 24 horas no Ceará, nos últimos cinco anos, passou de 13 para
32 unidades plantonistas.
Por fim, a pasta reforça que "foca nas ações de territorialização nas
regiões onde são registrados os maiores índices de crimes contra a vida,
bem como atua no fortalecimento da polícia investigativa nesses locais
para coibir a atuação e a disputa entre organizações criminosas".
Fonte: Diário do Nordeste
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