Como resultado da poluição do mar, das queimadas mais
intensas neste período e dos atropelamentos em rodovias cearenses,
animais silvestres demandam atendimento especializado que segue sem
definição no Estado. Cientes da importância ambiental de tartarugas
marinhas, cobras e tamanduás, por exemplo, bombeiros, voluntários e
profissionais se dedicam aos cuidados dos bichos que aparecem com
infecções, patas amputadas, queimaduras e desnutrição.
No ano passado, 2.727 animais domésticos e silvestres foram resgatados
em operações do Corpo de Bombeiros na Região Metropolitana de Fortaleza
(RMF). Em 2020, 2.609 bichos já precisaram do serviço de resgate. Quando
se considera os números dos municípios do Interior, o total neste ano,
de 3.968, já é superior ao de 2019, quando foram feitos 3.919
salvamentos.
Cobras, cães, gatos, vacas, cavalos e tartarugas são os animais
socorridos com maior frequência nas operações, mas também há registros
de porco-espinho, aves e tamanduás.
Sem apoio de equipamentos como do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais (Ibama), os animais capturados ficam sem o
tratamento adequado depois do recolhimento.
"Existe um padrão de ocorrência: quando possível, devolvemos ao habitat
e, quando não, trazemos para o quartel e buscamos alternativas. Não
temos (Polícia Ambiental) na cidade e o Ibama foi desativado faz alguns
anos. Isso dificulta o manejo em algumas situações", destaca o
comandante Nijair, do 4º Batalhão de Bombeiros Militar, na cidade de
Iguatu.
No caso de incêndios, os animais que conseguem sobreviver ao fogo, como
observa o comandante, se aproximam das casas em busca de água e de
alimento. "As queimadas têm modificado a dinâmica dos animais e daí a
importância de educar as crianças, trabalhar preventivamente, e buscar
denunciar as pessoas que estão diariamente ateando fogo", conclui.
O Sistema Verdes Mares procurou o Ibama para entender os motivos da
suspensão de atividades do Centros de Triagem de Animais Silvestres
(Cetas), de Fortaleza e do Crato, mas não obteve resposta até o
fechamento da reportagem. Em nota, a Superintendência Estadual do Meio
Ambiente (Semace), vinculada da Secretaria do Meio Ambiente (Sema),
informou que propõe assumir a gestão do Cetas há mais de um ano, mas
ainda não teve definição por parte do Ibama.
"No início de 2019, o Governo do Estado, por meio da Semace, solicitou a
cessão da gestão do Cetas. Foi licitado o fornecimento de ração,
medicamentos e frutas, mas como não tem os Acordo de Cooperação
assinado" não é possível estabelecer o contrato, acrescentou em nota.
Além disso, audiências no Ministério Público são realizadas para
resolver a questão.
Estrutura
Chegam gaviões, garças, tartarugas, cassacos, corujas e até capivara e
guaxinins no Hospital Veterinário Sylvio Barbosa Cardoso (HVSBC), da
Universidade Estadual do Ceará (Uece). Pela parceria com os bombeiros,
são aplicadas medicações e feitas cirurgias nos animais recebidos, no
entanto, a estrutura não dispõe do serviço de internamento, o que limita
a reabilitação de acordo com a situação das espécies.
"Sempre que eles trazem animais, seja após o resgate ou operações, como
os cães farejadores, a gente faz atendimento gratuito, mas não temos
internação e alguns necessitam desse serviço. A gente não tem como
interná-los porque não funcionamos 24 horas e isso muitas vezes
inviabiliza o tratamento completo", reforça o diretor do equipamento,
Dárcio Teixeira.
O professor e especialista observa que as queimadas próximas às vias
afugentam os animais e estes acabam sendo atropelados. Em outros casos,
os bichos são resgatados em apreensões feitas pelo Batalhão de Polícia
do Meio Ambiente (BPMA). Até agosto deste ano, em meio à pandemia da
Covid-19, caiu pela metade este tipo de operação, com 2.215 animais
salvos. Em igual período do ano passado foram 4.430 bichos resgatados.
Dárcio Teixeira explica que algumas espécies estão adaptadas à região e
exercem função relevante para o equilíbrio ambiental e, por isso, o
objetivo é tratar os animais e reintroduzi-los ao habitat.
Esforço conjunto
Cada vez que o telefone toca com a notificação sobre encalhe de animal
vivo, os voluntários do Grupo de Estudos e Articulações Sobre Tartarugas
Marinhas (GTAR), do Instituto Verdeluz, iniciam corrida contra o tempo.
"A gente recebe o chamado das pessoas e faz o monitoramento da Praia do
Futuro, da Sabiaguaba e do Titanzinho", detalha uma das coordenadores
do Gtar, Alice Frota. Até o início de outubro, o grupo contabiliza mais
de 40 animais resgatados na RMF.
A bióloga explica que as tartarugas marinhas encontradas na faixa de
areia não devem ser devolvidas à água porque, provavelmente, o estado de
saúde do animal está comprometido. "Uma tartaruga encalha porque ela
está tão mal que não consegue mais ficar no mar e colocar a cabeça fora
d'água para respirar. Elas encalham muito debilitadas, com problema no
intestino, infecção e levam pelo menos dois meses para ser totalmente
reabilitadas".
Por falta de carros e aporte financeiro, como observa a voluntária, a
área de monitoramento ainda é limitada, mas a parceria com os bombeiros
resulta também em formações de salvamento de animais aquáticos. "O que a
gente ainda consegue fazer é a primeira avaliação, saber quão
debilitado o animal est. Agora temos um tanque de 500 litros",
acrescenta. Em outros momentos, as tartarugas precisaram ser mantidas em
casa de voluntários por falta de espaço adequado.
Além disso, o grupo reivindica a criação de um centro de reabilitação
para os animais, com estrutura para funcionamento ininterrupto e com
profissionais especializados no Estado. "A gente está buscando essas
parcerias para conseguir viabilizar um local onde possa ter esse centro
de triagem, uma coisa inicial, com carro disponível para levar o animal
para o centro permanente", destaca. Há cerca de dois anos, o Projeto
Cetáceos da Costa Branca, no Rio Grande do Norte, recebe tartarugas
marinhas encontradas no Ceará. Já foram nove animais tratados pela
instituição, mas o processo de transferência é difícil para os
voluntários.
Fonte: Diário do Nordeste
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